A mais expressiva figura política
da república brasileira, primeiro ditador do país e mais tarde presidente
eleito pelo voto popular e universal, Getúlio Vargas conduziu processos de
reformas que puseram o Brasil agrário e semicolonial no caminho do
desenvolvimento industrial, lançou as bases de uma legislação trabalhista e
inaugurou o populismo e a intervenção do estado na economia.
Getúlio Dornelles Vargas nasceu
em São Borja RS, em 19 de abril de 1883. Estudou as primeiras letras com um
mestre-escola na cidade natal. Depois da revolução federalista (1893-1894), o
pai, chefe castilhista, fê-lo continuar os estudos em Ouro Preto MG, onde já se
encontravam dois irmãos mais velhos, Viriato e Protásio, cursando a Escola de
Minas. Um incidente entre estudantes gaúchos e paulistas, de que resultou a
morte de um jovem de São Paulo, levou-os de volta a São Borja. Em 1898, com o
propósito de facilitar seu ingresso na escola militar, Getúlio assentou praça
como soldado raso no 6º batalhão de infantaria em São Borja e foi promovido um
ano depois a sargento. Matriculou-se em 1900 na Escola Preparatória e de Tática
de Rio Pardo RS, da qual logo se desligou em solidariedade a colegas expulsos.
Concluiu o serviço militar em Porto Alegre.
Em 1903, em conseqüência da
questão do Acre e da ameaça de guerra entre Brasil e Bolívia, apresentou-se
como voluntário e foi para Corumbá. Com a assinatura do Tratado de Petrópolis,
Getúlio voltou ao estado natal e matriculou-se na faculdade de direito de Porto
Alegre, em 1904. Ajudou a fundar o Bloco Acadêmico Castilhista, que propagava
as idéias de Júlio de Castilhos. Em 1907, participou do lançamento do jornal O
Debate, do qual se tornou secretário de redação. No mesmo ano, diplomou-se e
foi nomeado para o cargo de segundo promotor público no tribunal de Porto
Alegre. Regressou logo depois a São Borja, onde começou a exercer a advocacia.
Iniciação política. Eleito
deputado estadual pelo Rio Grande do Sul em 1909, Getúlio reelegeu-se em 1913,
mas rompeu com Borges de Medeiros e renunciou ao mandato. Retornou a São Borja,
onde voltou a atuar como advogado. Reconciliou-se com Borges de Medeiros em
1917, elegeu-se novamente deputado estadual e tornou-se líder da maioria. Cinco
anos depois, elegeu-se deputado federal. Foi autor da lei de proteção ao
teatro, que levou seu nome, e participou ativamente da reforma constitucional
do governo Artur Bernardes, que fortaleceu o poder executivo.
Presidente da comissão de
finanças da Câmara de Deputados, assumiu o Ministério da Fazenda em 1926,
a convite de Washington Luís, e formulou
um plano de estabilização monetária, que previa a criação do cruzeiro. Em 1928,
deixou a pasta para candidatar-se pelo Partido Republicano do Rio Grande do Sul
à presidência do estado. Eleito, formou um governo de coalizão com todas as
forças políticas.
Revolução de 1930. Em 1929,
intensificaram-se as articulações para a sucessão de Washington Luís, que
procurava impor o nome do paulista Júlio Prestes. Minas Gerais, Rio Grande do
Sul e Paraíba organizaram a Aliança Liberal e lançaram a chapa Getúlio Vargas e
João Pessoa para a presidência. As eleições de 1º de março de 1930 deram a
vitória a Júlio Prestes, mas houve denúncias generalizadas de fraude. Nos
estados em que a Aliança saiu vitoriosa, os eleitos para o Congresso não
tiveram seus mandatos reconhecidos. O clima tenso da política nacional
agravou-se com o assassinato de João Pessoa, em 26 de julho; em 3 de outubro, com
o apoio do movimento tenentista, a revolução foi deflagrada no Rio Grande do
Sul. No dia 24 do mesmo mês, Washington Luís foi deposto, e em 3 de novembro
uma junta de governo transmitiu o poder a Getúlio, chefe civil da rebelião.
Como chefe do governo provisório,
Vargas suspendeu a constituição de 1891, fechou o Congresso Nacional e reduziu
de 15 para 11 o número de juízes do Supremo Tribunal Federal. Nomeou
interventores para os estados e, na composição do governo central, procurou
contentar as diversas forças políticas que o apoiavam. Criou os Ministérios do
Trabalho, da Indústria e Comércio e da Educação e Saúde. Promulgou uma nova lei
sindical e anunciou um programa de 17 pontos, que incluía as principais
promessas da Aliança Liberal.
O principal movimento de oposição
a Getúlio no período foi a revolução constitucionalista em São Paulo, em 1932,
que contou com a participação de muitos políticos que atuaram no movimento de
1930, como Borges de Medeiros, João Neves da Fontoura, Lindolfo Collor, Maurício
Cardoso e Batista Luzardo. Vargas saiu vitorioso do conflito, mas precisou
fazer concessões aos rebeldes derrotados. Dentre elas, a maior foi a convocação
de eleições para uma assembléia constituinte, que em 1934 promulgou uma nova
constituição, de caráter liberal e eclético, que aprovou a eleição indireta do
presidente pela própria constituinte. Em 17 de julho do mesmo ano, Vargas foi
eleito presidente da república por quatro anos.
Com a posse de Getúlio,
inaugurou-se um período de permanente crise política e institucional, marcado
pelo conflito entre as forças tradicionais, representadas pelo Congresso, e o
poder executivo. O cenário se agravava com a pressão crescente exercida por
movimentos de conteúdo nitidamente ideológico, como a Ação Integralista Brasileira,
de direita, e a Aliança Nacional Libertadora, de caráter esquerdista e posta na
ilegalidade por Vargas em 1935. Nesse período, Vargas criou a previdência
social e os institutos de aposentadorias e pensões.
Estado Novo. Com eleições diretas
marcadas para 1938, Getúlio Vargas alegou a existência de um plano comunista
para desencadear a guerra civil e pediu poderes excepcionais ao Congresso.
Armado com eles, dissolveu a Câmara e o Senado, fez prender e exilar os
principais líderes da oposição, revogou a constituição de 1934, suspendeu as
eleições e instaurou no país o Estado Novo. Sob a ditadura, Vargas reprimiu
toda a atividade política, adotou medidas econômicas nacionalizantes, como a
criação do Conselho Nacional do Petróleo e da Companhia Siderúrgica Nacional,
além do início da construção do complexo siderúrgico de Volta Redonda e criou
as bases para a formação de um corpo burocrático profissional, com a instalação
do Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP).
Na política externa, valeu-se da
divisão de forças no plano internacional para tirar o melhor proveito político
e econômico. Com a segunda guerra mundial, no entanto, essa posição se tornou
insustentável. O afundamento de 37 navios brasileiros no Atlântico e a pressão
da opinião pública levaram o presidente a declarar guerra à Alemanha, em 1942.
A participação do Brasil no conflito, ao lado dos aliados, acelerou o processo
de redemocratização do país. Em abril de 1945, decretou-se a anistia ampla para
centenas de presos políticos, entre eles o chefe comunista Luís Carlos Prestes.
Um mês depois, Vargas marcou as eleições para 2 de dezembro. Apesar do
movimento "queremista", que lutava pela continuação de Vargas no
poder, o presidente foi deposto em outubro de 1945 por um golpe militar e
retornou a São Borja.
Nas eleições de 2 de dezembro,
Getúlio elegeu-se senador pelo Rio Grande do Sul e por São Paulo e deputado
federal pelo Distrito Federal e mais seis estados, mas manteve-se em São Borja,
em exílio voluntário. Promulgada a nova constituição em 1946, Vargas ocupou sua
cadeira no Senado. Em 1950, candidatou-se à presidência pelo Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB). Seu principal adversário foi o brigadeiro Eduardo
Gomes, que concorria pela União Democrática Nacional (UDN). Eleito em outubro,
Vargas tomou posse em janeiro de 1951.
Presidência e crise. Getúlio
Vargas organizou um ministério no qual todas as forças políticas estavam
representadas, inclusive a UDN. Mas a oposição, desde os primeiros dias, moveu
uma campanha permanente contra o governo. Vargas, que não encontrava apoio para
seu programa reformista, voltou-se para os trabalhadores que, após anos de
política paternalista dos sindicatos, alimentada pelo próprio Getúlio, não
estavam suficientemente organizados. Defendia uma política nacionalista, como a
que orientaria a criação da Petrobrás, em 1954, mas foi obrigado a fazer
algumas concessões nesse terreno.
A nomeação de João Goulart para o
Ministério do Trabalho, em 1953, causou desconfianças nos círculos militares,
políticos e empresariais. Acusava-se o novo ministro de pretender elevar o
salário-mínimo em cem por cento. Em fevereiro de 1954, foi entregue ao ministro
da Guerra um manifesto assinado por 48 coronéis e 39 tenentes-coronéis, que
exprimia o descontentamento das forças armadas. Para controlar a situação,
Getúlio nomeou Zenóbio da Costa para o Ministério da Guerra e demitiu João
Goulart.
Para retomar a ofensiva,
anunciou, em 1º de maio, um aumento de cem por cento para o salário-mínimo e
pediu aos trabalhadores que se organizassem em defesa do governo. Em
represália, a oposição denunciou o aumento salarial como inflacionário e
demagógico e apresentou ao Congresso um pedido de impeachment do presidente. Na
madrugada de 5 de agosto, o jornalista Carlos Lacerda, que fazia oposição
aberta ao governo, foi ferido num atentado a tiros no Rio de Janeiro. O
major-aviador Rubens Vaz, que o acompanhava, morreu.
Iniciou-se uma crise política sem
precedentes. A Aeronáutica promoveu uma caçada ao criminoso, que, encontrado,
revelou suas ligações com a guarda pessoal do presidente. Getúlio dissolveu a
guarda e determinou a abertura do Catete às investigações policiais. Gregório
Fortunato e outros membros da guarda palaciana foram presos e descobriram-se
várias irregularidades. O presidente declarou que, sem seu conhecimento, corria
sob o palácio "um mar de lama".
A pressão sobre o governo
cresceu. Os militares exigiam a renúncia do presidente, que, na noite de 23
para 24 de agosto, reuniu o ministério e concordou em se licenciar até que todas
as responsabilidades pelo assassinato do major Vaz fossem apuradas. O Exército,
no entanto, não aceitou o afastamento temporário. Diante do impasse, Getúlio
suicidou-se, com um tiro no coração, no palácio do Catete, no Rio de Janeiro
RJ, em 24 de agosto de 1954, deixando uma carta-testamento de natureza
fundamentalmente política.
Nenhum comentário:
Postar um comentário